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Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver

Entrar na sua casa com medo já lhe tinha acontecido muitas vezes. Mas digam a uma miúda de 16 anos, que tem que entrar na sua casa pela última vez, e ser rápida a escolher o que precisa trazer e vejam a reacção dela. Se olharem atentamente, confusão é a primeira coisa que lhe vão ver passar pelo olhar. Depois tristeza. E no fim, raiva. Muita raiva. Não fizera nada de errado. Porque é que aquilo estava a acontecer? Pensava enquanto entrava no seu quarto. Ao entrar dá-se conta que não tem a menor ideia do que poderão ser “bens essenciais” como o polícia lhe disse há pouco. Calcula que ele se esteja a referir a roupa, e talvez os materiais da escola. A mãe entrega-lhe um saco do lixo, daqueles pretos enormes. Mais uma vez ocorre-lhe o quanto é injusta aquela situação. Porque raio é que tinha que meter as suas coisas num saco do lixo? A raiva enche-lhe os olhos de lágrimas. Mas sabe que tem que ser rápida, por isso mais vale começar. Mas por onde? Roupa. Material escolar. Brincos, colares e esse tipo de acessório. Livros, CLARO. Não vai deixar nem um dos seus livros nas prateleiras. Cd’s. Dá-se conta da quantidade de cd’s que tem. Será que levo todos? – pensa em quanto percorre com os olhos os mais de quarenta cd’s que tem na prateleira. Decide-se por levar apenas os que tem ouvido mais. O saco já está cheio. Está prestes a sair do quarto para pedir mais sacos à mãe quando repara que ela lhe deixou um rolo deles na soleira da porta. As lágrimas vêm-lhe aos olhos. – É claro que a mãe sabe que um saco nunca me iria chegar - pensa com carinho. Despeja gaveta após gaveta. Limpa o conteúdo de cada prateleira, disposta a não deixar nada para trás. Mas deixa. Deixa os sonhos. Deixa a inocência. Deixa o sítio onde ela achava que estava segura. O sítio onde ela passou a maior parte dos seus dias, o seu porto de abrigo. A mãe vem chamá-la. Está na hora de ir embora. Ela resmunga que foi rápido demais, e a mãe diz-lhe que estão ali há quase uma hora. Têm mesmo que ir. Uma hora? Não deu conta do tempo passar. Pensa ela, para logo de seguida outro pensamento lhe surgir: mais de dez anos naquela casa, a vida que ela conhecia, e uma hora é o tempo que lhe dão para se despedir? Olha à sua volta mais uma vez. As paredes do quarto de dois tons de rosa por ela escolhidos, os detalhes da cama pintados à mão, por ela, da cor da parede. As estrelas e a lua coladas no teto brilhavam no escuro. Neste ponto bebe as lágrimas. Não contém um soluço e lembra-se de repente que tem que ser forte. Pela mãe. Foi a mãe que sofreu a maior parte da violência. É à mãe que isto está a custar mais. Não pode chorar. Sai do seu quarto e fecha a porta. Lá dentro ficaram os sonhos.

Tem dezasseis anos e sabe, instantaneamente, ao sair para rua que esta será lembrada por ela como a experiência mais triste da sua vida.

30 Out, 2019

Um Rito de Passagem

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver

A primeira vez que pisa aquele chão não possui grandes expectativas. Estava a iniciar a vida numa cidade diferente e não tinha qualquer ilusão de que iria ser fácil. Logo que entra dá-se conta que, muito provavelmente, lhe vai ser impossível alugar aquele apartamento. Não porque seja grande ou luxuoso. Mas porque está completamente mobilado e, à primeira vista, feito com algum cuidado. Enquanto passa os olhos pelas, poucas, divisões ouve a proprietária da casa dizer-lhe que é uma pena que tenha vindo de noite pois da janela da sala consegue avistar-se o mar. – Pronto, mais vale sair sem ver mais nada, ainda por cima estava a gostar – pensa de forma triste. Passada a visita à casa pergunta o valor da mensalidade. Fica, incrivelmente, feliz quando chegam a um acordo sobre o valor. Valor esse que ela pode pagar. A felicidade que se apodera dela é tanta que nem sabe como reagir. É oficial. Vai viver sozinha. Dá-se o rito de passagem para a vida autónoma. Hoje ao lembrar-se desse momento sabe que foi um dos melhores da vida dela. Aquela sensação de ter conquistado algo. De tê-lo feito sem ajuda. Sempre foi muito independente. Caramba, por vezes é até demais, negando ajuda mesmo quando sabe que precisa. Sentada na varanda da sala a olhar o mar pensa em como há momentos que nos marcam para sempre. Que se colam à nossa memória de tal forma que podemos estar a fazer qualquer coisa totalmente aleatória e eles surgirem do nada. Sentiu, naquela noite quente de Julho, que essa seria a melhor decisão que tomaria na vida.

Mal sabia ela a repercussão que essa decisão iria ter na sua vida, e como iria alterar o rumo da mesma.

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver

Entramos no carro e a primeira coisa que faço, após ele rodar a chave na ignição, é ligar a música. Tenho uma pen no carro com mais de mil músicas. Sim, nunca as ouvi todas, tenho a certeza disso. Essa, bendita, pen salta do meu carro para o dele consoante o carro que escolhemos para sair. – Vou meter a minha música – digo, mais para mim que para ele. Ouve-se Sia - Fire Meet Gasoline a sair das colunas. Ele olha para mim com a confusão estampada no rosto. – Mas ontem não disseste que a tua música preferida era Calema - Vai? – diz ele admirado. – Sim e é – digo como se fosse a verdade mais absoluta do mundo. Ele parece confuso mas não diz nada.

Num outro dia qualquer vamos no carro e eu, mais uma vez, digo que vou meter a “minha música”. Ele não parece dar importância até ouvir Metallica - The Unforgiven a bombar nas colunas. Baixa o rádio e diz: - Porra, a tua música não era um pouco mais calminha ontem? – os olhos escancarados e o tom quando diz “ a tua música” denunciam a sua admiração. – Ok, vou mudar. – digo enquanto procuro a “minha” música. Hungria - Um pedido começa a tocar, olho-o e ele parece-me mais aliviado por ser algo mais calmo. Olha para mim como quem aceita e continuamos a viagem.

Vamos ao Alentejo ver a minha família. Como sempre sou eu a Dj. Escolho a “minha” música. Banza - Minha Terra, meu encanto .Ele olha para mim e ri. – Sério? – pergunta a sorrir. – É para entrarmos no espírito, vá lá – digo não conseguindo evitar a gargalhada. Cante alentejano não é música que ele me julgue capaz de ouvir no carro. Mas eu sou alentejana não é? Alentejana que se preze tem cante alentejano nas suas playlists. Ele não reclama e continuamos a viagem. Não ouço a próxima música daquela pasta. Nuca ouço mais que uma música de cada pasta. Fazer o quê? Tenho muito por onde escolher não é?  Creedence Clearwater Revival: Have You Ever Seen The Rain? toca agora. Ele ri-se e eu começo a abanar os ombros como quem dança. Não tarda e ele vai estar a bater com os dedos no volante. Trinta segundos? Cá está. Ninguém resiste. – Esta também é a tua música? – pergunta ele. – Claro que sim - respondo como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. – Nunca conheci ninguém que tivesse tanta “minha música” e de géneros tão diferentes – diz colocando a expressão “minha música” entre aspas usando os dedos.

Este post podia nunca mais acabar. Desde muito pequena que a música é a minha companhia. Gosto de música. Um pouco de tudo. Ouço música em todo o lado. Principalmente no carro e em casa a música nunca está desligada.

Não saberia escolher uma música favorita. Porque elas mudam todos os dias. Depende do estado de espírito, sabem?

Não posso deixar de falar aqui num dos meus tios. Cresci sem pai. O que me levou a ter várias figuras masculinas da família como pai. Sendo que um deles foi um dos meus tios que é, e sempre foi, louco por música. Confesso que, muito por influência dele, as minhas músicas favoritas estão entre os hits dos anos 80, 90. Gosto de todo o tipo de música mas se há música que me enche de emoção é a música dessas épocas.

Mas como já referi gosto de tudo um pouco. Assim sendo, não me vou alongar, mas vou deixar algumas daquelas que nunca me deixam indiferente. Parece que me tocam no mais profundo da alma, aquecem-me o coração, e, admito, arrancam-me algumas lágrimas embora não saiba dizer o porquê.

Rainbow - Catch the Rainbow

Eric Clapton - Tears in Heaven

Brian Adams - (Everything I Do) I Do It For You

Patrick Swayze - She's Like The Wind

Kaoma - Lambada

Sia - Loved Me Back To Life

Eric Carmen - Hungry Eyes

Pink Floyd - Wish you Were Here

Linkin Park - In The End

Sarah McLchlan - In The Arms Of an Angel

Vaults - One Last Night

Coldplay - The Scientist

Bryan Adams - Heaven

Il Divo - Hasta Mi Final

Robbie Williams - Angels

 

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