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Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Balanço de 2019

O fim de um ciclo O primeiro dia nos 29!

V de Viver, 28.11.19

Sempre fiz o balanço do ano perto do dia 31 de Dezembro. Penso que não serei a única. É quando se aproxima um novo ano que gostamos de olhar para trás e ver se cumprimos aquilo a que nos propusemos durante os fogos do reveillon. Contudo, este ano dei por mim a pensar que, para mim, faz sentido fazer esse balanço no dia do meu aniversário. Bem vistas as coisas é no dia do nosso aniversário que iniciamos um novo ano, não vos parece? Talvez seja só um devaneio meu. Mas este ano, pela primeira vez na vida, dou por mim a fazer essa análise um dia após o meu aniversário

Ontem entrei nos 29. E dou por mim a pensar que já conquistei muita coisa e que tenho outras tantas para conquistar. Sei que nunca vou estar satisfeita porque o ser humano é assim mesmo. Mas quando olho para o meu passado, para a minha história no geral e, em específico, para o ultimo ano, não consigo deixar de chorar.

O último ano foi o mais louco de todos na minha vida. Foi difícil, complexo, doloroso, exigente e longo, demasiado longo. Não sei sequer o que escrever sobre ele. 

Espero que os 29 me tragam clareza, sabedoria, inteligência e resiliência para lidar com a vida. Para lidar com as pessoas, e, sobretudo, para lidar comigo.

Perdi-me algures durante 2019. Foi preciso a vida obrigar-me a parar (sim, acredito que a forma estúpida como fiz a lesão no pé só pode ter sido a vida a arranjar forma de me parar!) para eu ver que não estava no caminho certo. Para eu ver que já não era eu. E, sim, é normal. Estamos em constante mudança. Mas nunca devemos aceitar mudar para algo que não nos agrada. A pessoa triste, irritada, mal-humorada, e, acima de tudo, resmungona que substituíu a pessoa alegre, bem disposta, brincalhona e simpática que eu era não me agradou nem um pedacinho. Existia dentro de mim uma luta constante para trazer à tona a rapariga que eu era e que senti que se afogava no meio de um onda de escuridão. Não me dediquei tempo, não me dediquei atenção. Vivi, completamente, em piloto automático e isso trouxe-me problemas graves. Estava a tornar-me uma pessoa insuportável, até para mim. Sobretudo para mim. Odiei-me de cada vez que dei por mim a  reclamar. Odeio pessoas reclamonas. Sempre segui o lema de: "Se não tem remédio, porque te queixas? Se tem remédio, porque te queixas?" E eu fui, durante o último ano, a pessoa que se queixava de tudo. Deixei-me levar por aquilo que achava que já devia ter. E esqueci-me de agradecer aquilo que já tenho. Foquei-me tanto, mas tanto, nos problemas que deixei de conseguir ter energia para arranjar soluções.

Não quero esquecer estes últimos doze meses porque sei, no fundo, que foi preciso chegar ao fundo do poço para tomar impulso e sair de lá. Foi um ano escuro. Muito escuro. Mas como já li algures: uma certa escuridão é necessária para ver as estrelas.

Sinto que desde que me lesionei, voltei a ser eu. Este retorno a mim não foi imediato. Não foi algo do género lesionei-me e já está, milagrosamente sou eu outra vez. Não. Nada disso. As primeiras duas semanas foram horriveis, tanto mais que, como se não bastasse tudo o resto, a minha avó faleceu. A minha avó que era como uma mãe para mim. (Mas isso fica para outro dia, outro post porque este já vai longo.) Tudo isto foi um balde de água fria. Mas um dia acordei e percebi que conseguia lidar com tudo isto. Que ainda havia uma forma de sair do fundo do poço. Tinha que haver.

E havia. Aqui estou eu outra vez. Renascida das cinzas qual fénix com vontade de viver. 

Feliz aniversário para mim, e que este ano me traga a paz interior que eu sempre aspirei alcançar. Pois quando estamos em paz, o resto tanto faz.

Carta ao meu pai

O pai que nunca tive, o pai que nunca me quis

V de Viver, 25.11.19

Olá pai! Gostava de te fazer algumas perguntas. 

De que cor são os teus olhos, pai? Qual é a cor do teu cabelo? És alto? És magro? Vives onde, pai? Tenho realmente duas irmãs como diz quem te conhece? É verdade que elas são enfermeiras, as duas? É verdade que vives numa casa muito grande e que tens um carro topo de gama? Os teus pais ainda são vivos, eu ainda tenho avós? Tenho muitos primos, pai? Vocês juntam-se sempre nos aniversários e no Natal, pai? A família é muito grande? 

Desculpa lá, pai. Mas tenho tantas, mas tantas perguntas.

Porque é que nunca me quiseste, pai? Porque é que abandonaste a mãe quando ela mais precisava de ti? Quando ela viu morrer o irmão mais novo tendo um bebé prestes a sair-lhe das entranhas. Seis dias, pai. Seis dias separaram a morte do irmão da mãe, do meu nascimento. E onde estavas tu, pai?

Porquê, pai? Porque é que me fizeste crescer e viver com a humilhação de ter um X no lugar do teu nome? Porque é que não quiseste sequer que eu tivesse o teu apelido? Namoravas a mãe há muito tempo quando ela ficou grávida, se fosse uma aventura de uma noite eu podia fingir que respeitava a tua decisão. Não respeitaria. Mas, pelo menos, poderia ir buscar algum consolo a esse facto. Mas esse facto não existe, pai. Vocês eram namorados. E tu escolheste abandoná-la.

Julgaste ser cedo, pai, ter essa designação aos vinte e sete anos? Então porque é que foste pai logo no ano seguinte? E outra vez logo a seguir. Duas filhas. Duas raparigas. Eu também sou rapariga, pai!

No que é que elas são melhores que eu, pai? Não tenho ciúmes, como poderia ter? Nunca te conheci. Tenho dúvidas, pai, e curiosidade. Porquê, pai? Porque é que elas tiveram direito a estudar na universidade, segundo fala quem te conhece. Porque é que elas tiveram o privilégio de formar-se em enfermagem, as duas? Porque é que elas tiveram direito a uma vida recheada e eu não, pai? Decidiste que elas seriam melhores que eu mesmo sem me conheceres?

Porque é que nunca enviaste um cêntimo à mãe, pai? Sabias que ela trabalhou muito, todos os dias, do nascer ao pôr do sol, para que eu conseguisse estudar? Não conseguiu pagar-me os estudos na universidade. Mas ficou, imensamente, feliz quando acabei o secundário sendo das melhores alunas da escola. Sim ela ficou muito orgulhosa. E sabes o que ela sentiu depois, pai? Quando não me conseguiu pagar os estudos na universidade? Quando me viu obrigada a trabalhar para ajudar? Não sabes pois não, pai? O que é olhares para a tua mãe e veres chispar nos olhos dela a desilusão de quem se esforçou para conseguir um futuro para a filha e não conseguiu, ainda assim, proporcionar-lho. Não sabes, pai. O que é veres a tua mãe dizer que não tem fome e saberes que o que ela está a fazer é a dar-te a comer a última refeição que tem em casa. Não sabes, pai.

Mas ainda tenho mais perguntas, pai. Uma vida inteira delas.

Porque é que nunca tiveste curiosidade em me conhecer? Sabes o que eu faço na vida, pai? Sabes onde cheguei? Provavelmente se soubesses ficarias feliz. Ficavas, pai? Ou tudo o que é relacionado comigo não te interessa mesmo? 

Porquê pai? Porque é que me obrigaste a crescer sem saber o que é chamar pai a alguém? Tiveste tantos anos para me procurar, pai. Sempre soubeste onde a mãe vivia. Sempre soubeste como era fácil encontrar-me naquele meio pequeno. Mas nunca quiseste, pai. 

Não sei o teu nome completo. Não sei a tua idade. Não sei a tua data de aniversário. Não sei sequer qual é o teu aspecto. Quem sabe se não nos cruzámos já alguma vez, pai? Talvez.

Sabes pai, estou quase a fazer vinte e nove anos. Sim, faço-os esta semana. E a idade trouxe-me maturidade. Mas a idade trouxe-me, sobretudo, sabedoria. Sabedoria para saber que algumas perguntas nunca vão ter uma resposta. Mas, mais importante que isso, a vida e a idade mostraram-me que por vezes tudo aquilo que nós mais queremos, deixa, um dia, de fazer sentido. Que as respostas que tanto almejavamos deixam de ser importantes. 

Sempre te quis, pai. Sempre quis que me quisesses, pai. 

Sonhei durante muitos anos que um dia tu chegarias ao pé de mim com uma resposta para cada uma das minhas perguntas. E até me atrevi, tamanha era a minha inocência, a pensar que, talvez, talvez essas respostas fizessem sentido. Talvez tu tivesses tido os teus motivos para nos abandonares. 

Sonhava que chegarias perto de mim, me abraçarias e me pedirias perdão, em lágrimas. Que as nossas lágrimas se juntariam formando um imenso mar salgado. Que choraríamos juntos por tudo o que nos foi tirado, por todos os anos de afastamento. Que me apresentarias, com orgulho, à tua família. Que eu passaria a fazer parte da tua vida.

Mas foste tu, não fostes, pai?

Foste tu que nos tiraste estes anos todos. Foste tu que não me quiseste. Foste tu que escolheste fingir que eu nunca existi. E és tu que continuas a fingir que eu não existo.

Mas sabes que mais, pai? 

Eu não te quero. Não quero saber o teu nome. Não quero saber quem és ou onde estás. Não quero fazer parte da tua família. Não quero, sequer, saber se estás morto ou vivo. Embora saiba que estás vivo porque há sempre alguém que faz questão de me lembrar.

Tu, paizinho, foste um cobarde.

E existem cobardes que se arrependem e voltam atrás. Emendam os seus erros. Remendam o passado agindo no presente. Mas tu não. Tu nunca o quiseste fazer. Foi mais fácil para ti fingires que eu não existia. 

Foste um cobarde, pai. 

Hoje posso afirmar, feliz, que não preciso de ti. Mas já precisei muito. Já me fizeste muita falta.

Mas não mais. 

Fecho este ano o ciclo durante o qual fui apenas uma menina à espera que o pai a amasse. À espera que o pai a quisesse, lhe desse carinho e amor. Uma menina que sentiu sempre que tinha feito alguma coisa errada. Que cresceu a pensar que se o pai não a queria ninguém a ia querer. Uma menina de olhar triste que sorria, chorando por dentro, sempre que via os primos a ter uma brincadeira com o pai. Os amigos com os pais nas festinhas da escola. Que se enchia de lágrimas ao ver uma filha com um pai fosse qual fosse a situação.

Essa menina deixou de existir hoje. Agora mesmo ao finalizar este texto.

Adeus, pai!

Excertos que me tocaram a alma #3

Sobre finais felizes

V de Viver, 22.11.19

"Não há finais felizes, reflectiu de si para si. Todos temos um sétimo selo para quebrar, um destino à nossa espera, um apocalipse no final da linha. Por mais êxitos que somemos, por mais triunfos que alcancemos, por mais conquistas que façamos, para a última estação está-nos sempre reservada derrota. Se tivermos a sorte e nos esforçarmos por isso, a vida até pode correr bem e ser uma incrível sucessão de momentos felizes, mas no fim, faça-se o que se fizer, tente-se o que se tentar, diga-se o que se disser, aguarda-nos sempre uma derrota, a mais final e absoluta de todas elas."

 

José Rodrigues dos Santos, O Sétimo Selo

Uma Metáfora para a Vida

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 21.11.19

Não deixa de ser engraçado que seja hoje, no último dia deste desafio de escrita em que decidi entrar, que tenho um completo bloqueio. É a primeira vez, desde que me propus a entrar no desafio, que não me ocorre o que escrever. Uma metáfora para a vida. Existem tantas metafóras para a vida. Gosto daquela que diz "A vida é como andar de bicicleta, é só manter-se em movimento". Podia pegar nela e desenvolver alguma coisa. Mas gostava de escrever algo que me saísse da alma, das entranhas. O que, admito, não será tarefa fácil, até porque é impossível saber se o que eu escrevo aqui não é também escrito por outra pessoa em qualquer outro lugar no mundo. E, além disso, para quem como eu, lê muito, acaba por ser difícil não escrever, mesmo que inconscientemente, algo que já leu algures. Mas enfim, já estou a divagar. Ora então uma metáfora para a vida. Assoma-se-me ao espiríto uma montanha russa. Tenho a certeza que já alguém fez esta comparação com a vida. Mas é verdade. A vida é mesmo como uma montanha russa. Ora estamos lá em cima. Felizes, afortunados, realizados. Satisfeitos com o nosso dia a dia, com a forma como conduzimos a nossa vida. Com o que já conquistámos. Onde já chegámos. Ou então, um dia, acordamos e estamos cá embaixo. Descemos a pique, sentindo aquele borbulhar no estomâgo de quando fazemos uma descida muito acentuada e veloz. Olhamos para nós e sentimos apenas desilusão. Fracasso. Derrota. Azar. Outros dias há, ainda, em que acordamos com a sensação de que estamos virados do avesso. Cabeça para baixo e pés para o ar. Uma total sensação de não sabermos o que andamos aqui a fazer. De não sabermos como chegámos onde estamos. Mas a vida não é, e não pode ser, só isto. Não. A vida é como o mar. Ora estamos cheios, ora estamos vazios. A vida é, também, como um livro. Uns capítulos são felizes, outros são tristes. Cada página escrita por nós. Cada linha uma atitude, uma ação que considerámos ser a mais certa. Cada letra a formar palavras que articulámos. A vida é uma série de histórias, e também de não histórias tendo em conta tudo aquilo que não foi, mas que poderia ter sido. É uma constante linha de equilibrio entre escolhas e consequências.  A vida pode ainda ser como andar de baloiço. Por vezes só conseguimos se nos derem um empurrãozito. É como uma flôr. Precisa de ser cuidada. Regada. A vida é tudo. A vida é o nosso maior milagre. A vida é um sorriso. É um carinho. É o amor. É a família. São as lágrimas. Os momentos que se cravam na nossa pele. A vida é a única coisa que temos. E é também a única coisa que sabemos que, um dia, acaba. Porque como disse Séneca: " Este é o único motivo pelo qual não nos podemos queixar da vida: ela não segura ninguém". 

Um Beijo de Amor

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 20.11.19

Existem vários tipos de amor. O amor apaixonado, aquele que causa borboletas no estômago. O amor sexual, carnal, aquele que nada mais é do que uma atração física. O amor de afeto , aquele que nos inunda o peito quando reunimos a família. O amor fraternal, leal que se pode dizer que é o que experenciamos nas amizades. O amor próprio, aquele que todos devemos cultivar dentro de nós, por e para nós. O amor platónico, aquele que todos (ou quase todos) tivémos em adolescentes, por exemplo, por um actor ou cantor, etc. O amor ao próximo, que nos permite ter empatia pelos outros. O amor aos animais, o amor aos bens materiais. O amor pela leitura, pela escrita, pela vida. Poderia falar de amor o resto da tarde, e até noite fora. Para mim, o amor pode significar uma coisa totalmente diferente do que poderá significar para vocês que me estão a ler. Não há definição para o amor. Mas penso que todos estamos em sintonia quando o assunto é o amor de mãe. Aquele que é o mais puro, mais autêntico, mais honesto, mais absoluto. O mais verdadeiro, mais fiel, real, palpável e incontestável. O mais obstinado, intrasigente e incansável. O amor mais duradouro, moroso, estável e eterno. Aquele que nunca, jamais, morre. Por esse motivo, quando vi o tema sobre o qual o desafio de escrita me pedia para escrever hoje, a primeira contemplação, a primeira coisa que se manifestou na minha mente foi um beijo da minha mãe. Porque é ali, naqueles lábios ternos, que eu sei que está o verdadeiro amor. O amor que nunca me irá abandonar. O amor que perdoa tudo. O amor que não apodreceu, não se desgastou, não se degradou quando, em adolescente, lhe respondia torto e lhe dizia que não estava certa. O único amor capaz de suportar tudo e ainda assim continuar ali, rijo, implacável, seguro, saudável, maciço, sempre pronto para mim. Um beijo de amor é o beijo da minha mãe.Os beijos que me despertaram enquanto criança e adolescente. Nunca fui acordada por um despertador, nunca. A minha mãe era o meu despertador. Os beijos da minha mãe acordavam-me todos os dias. Suaves, ternos, doces e afectuosos. Muitos não foram bafejados com essa sorte. Eu fui. Sei que muitos não tiveram essa chance, sei que existem aqueles a quem a vida não permitiu conhecer o sabor do carinho da mãe. Sei que fui uma afortunada. Nunca tive o amor de um pai. Nunca chamei pai a ninguém. Mas sempre tive, tenho e continuarei a ter, a certeza absoluta que a minha mãe fez o papel dela e o de pai. E fê-lo bem feito. Errou. Hoje, que sou adulta consigo ver os erros dela, mas consigo também entender que todos esses erros se deveram ao facto de achar que era o melhor para todos. Não lhe guardo rancor por nenhum desses erros. Pelo contrário. Se eu for, um dia, metade da mãe e mulher que é, e sempre foi, a minha mãe, serei feliz. Irei sentir-me realizada. A todas as mães que foram também pai, deixo aqui um grande beijinho de carinho e uma, enorme, salva de palmas por terem sido as lutadoras que foram. Saibam que tarde ou cedo, os filhos vão sempre reconhecer o vosso valor e perceber que vocês, mães, fizeram o melhor que conseguiam com aquilo que tinham. Por esse motivo, hoje, o meu beijo de amor vai para a minha mãe, e para todas as mães. 

Uma Esquina Marcante

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 19.11.19

Já passava das seis da tarde e o calor que se fazia sentir continuava a ser abrasador. Tinham passado as primeiras horas da tarde recolhidos no aconchego da casa dos avós. Deitados numas mantas, a ver televisão e comer batatas fritas. A escapar ao sol e ao calor, não por vontade deles, mas por ordem da avó. A hora de brincar lá fora era, geralmente, assinalada pela saída do avô para o quintal. Finalmente, depois do lanche, a avó deixava-os ir brincar para o quintal. O avô, sempre mais liberal que a avó, abria-lhes o portão para que pudessem correr e brincar, livremente, pela travessa. Na travessa não circulavam carros. Caminho de terra batida e com muitas pedras onde os joelhos eram constatemente raspados, não era, devido ao piso, usada como estrada de circulação.  Melhor para eles que corriam desimpedidos, interrompendo as brincadeiras apenas quando alguém os chamava. Bateram à porta de um dos vizinhos. Perguntaram à mãe do vizinho se ele podia ir brincar com eles. Ela anuiu e detrás dela, aos saltinhos, apareceu o menino que se lhes juntaria na brincadeira. Não se dando por satisfeitos foram bater a outra porta. Outra casa de onde saiu mais um companheiro de brincadeira. Assim era mais "fixe", quantos mais melhor. As brincadeiras eram das mais diversificadas que se possa conjecturar. Jogavam à macaca, ao macaquinho do chinês, ao rei manda, aos polícias e ladrões, e por vezes (poucas vezes) decidiam-se por uma brincadeira mais tranquila usando apenas os bonecos. Rabos sentados no chão de terra levavam a que no fim da brincadeira aparecesse terra até nos sítios menos provavéis, causando grande irritação nas mães. E a roupa? Cada tarde uma roupa diferente pois, após horas de brincadeira, a que traziam no corpo estava pronta para lavar, e por vezes até ir para o lixo. Adoravam fazer corridas de bicicleta, joelhos a sangrar, mãos raspadas e com pequenas pedrinhas cravejadas. Não havia lágrimas. Quem caía levantava-se ao som das gargalhadas dos restantes, e acabava por rir também. Mas a brincadeira que mais os deleitava era, sem dúvida, jogar às escondidas. A cada um, a começar pelo mais novo, cabia a exaustiva tarefa de tapar os olhos com as mãos, cabeça de encontro às mãos para terem a certeza que não havia forma de espreitar, e com a cabeça enconstada na parede daquela esquina, contar até cem. Corriam livres por todos os cantos da travessa, cada árvore um esconderijo. Cada relevo na terra uma forma de escapar ao olhar do que os procurava. A única regra era não se esconderem no interior de nenhuma das casas, nem se afastarem demasiado. Não saberiam explicar como, mas eles sabiam o que significava esse "demasiado" e nunca o ultrapassavam. Mas havia sempre um mais matreiro, que conseguia o feito histórico que tanto os fazia rir. Enquanto o que contava, sempre em voz alta, seguia a contagem sem demoras, o malandro escondia-se atrás das costas dele. Sem respirar, sem emitir qualquer som, assim que o que estava a contar dizia as palavras de advertência: "Aí vou eu!", o espertalhão batia na parede e dizia: "um, dois, três (o nome dele) estou salvo". O que causava um valente susto a quem acabara de contar, originando um salto e um safanão no manhoso. Sem maldade, com muita gargalhada e ofensas à mistura: "Aí seu parvo batoteiro". Tardes de risos, de brincadeira, amizade pura, inocência. Dias que se faziam semanas, que por sua vez se transformavam em meses e posteriormente em anos. Muita cumplicidade, embora uns mais novos que outros, quando brincavam era todos crianças, todos da mesma idade. Só se lembravam de usar a idade como diferença quando se tratava de jogar às escondias, afinal de contas, contar era a parte mais chata. Era muito mais emocionante encontrar um bom esconderijo. Tardes de verão a brincar, livremente, até ao sol posto. Até os avós ou os pais os chamarem para tomar banho e jantar, acabando com a euforia desmedida daqueles momentos. Recolhiam a casa sempre contrariados e amuados, mas sempre com a certeza que voltariam a repetir tudo na tarde seguinte. 

Aquela esquina marcante, local de contagens intermináveis até cem, batotas e risadas até doer a barriga, ainda continua no mesmo sítio. Lembrando a cada um deles as crianças que foram um dia. 

Um Equívoco Consertado

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 18.11.19

A avó encarregou-a de ir buscar o pão à lojinha da aldeia. E ela ficou toda contente por ser encarregada de uma actividade de adulto. Tinha doze anos, já não era propriamente uma criança. A loja ficava razoavelmente perto da casa dos avós. Numa aldeia pequena, em que todos se conhecem, e em plena manhã, naquela época, nada de mal poderia acontecer a uma menina. E, por esse motivo, a avó passou-lhe o dinheiro para mão e ela lá foi. Seguia pela rua, toda ela muito dona de si, quando uma senhora a agarrou com entusiamo e lhe deu, o que lhe pareceram ser, uns cem beijos nas bochechas. Ela ficou estupefactada mas uma vez que a senhora não parava de lhe dar beijos e abraça-la dizendo, repetidamente: "Aí mas que grande estás minha pequenina" ela pensou, do alto da sua inocência, que deveria ser alguma tia da sua mãe que ela agora não recordava. A senhora parecia-lhe engraçada, cabelo muito vermelho, calças castanhas, blusa cor de rosa shock, e umas botas de salto altíssimo. Devia ter uns cinquenta anos, reflectiu ela, o que a levava de seguida a pensar que já era um bocado velha para andar com aqueles saltos. Com doze anos, todas as pessoas que aparentem ter mais de vinte, são consideradas velhas. A senhora ajeitou-lhe uns fios cabelo, que lhe pendiam sobre o rosto, atrás da orelha e disse: - Então e os manos como estão minha flor? - Ok, pensou ela, a senhora está a confundir a família toda. - Eu só tenho uma irmã pequenina minha senhora, deve estar a falar dos meus primos. - disse a menina. A senhora pareceu confusa mas continuou: - Uma irmã? Aí que engraçadinha que tu és. Tal e qual o teu paizinho não é meu doce? - disse a senhora num tom que começava agora a irritá-la um bocadinho. - Eu não estou a brincar minha senhora. Como lhe disse eu só tenho uma irmã. Mas tenho dois primos rapazes - respondeu ela com sinceridade. Nesse momento a senhora pôs-se a olhar para ela, muito séria, de cima a baixo. Inclinava a cabeça para um lado e para o outro e, possivelmente, aquilo só durou uns segundos, mas a ela parecia-lhe já estar ali há uma eternidade. Começou a pensar que a avó iria estranhar a demora e ficaria preocupada. - Olhe, desculpe minha senhora, mas tenho que ir buscar o pão e voltar para casa, a minha avó vai ficar preocupada, - disse ela, preparando-se para seguir viagem. Mas a senhora deu um ligeiro gritinho e disse, boquiaberta: - A tua avó? Mas a tua avó não faleceu já? A senhora parecia aterrorizada com a conversa. Felizmente, a senhora disse de seguida: - Tu não és a menina da Amélia? Ela negou. Disse que a mãe não se chamava Amélia, e disse o nome da mãe. A atitude da senhora não a espantou - Aí não posso acreditar que cresceste tanto? Oh minha fofa dá cá mais dois beijinhos - disse a senhora que parecia, agora, ainda mais entusiasmada. Não lhe deu dois, mas sim cerca de seis beijinhos. Depois pareceu lembrar-se de alguma coisa importante, olhou o relógio e disse: - Oh docinho desculpa lá este meu equívoco mas és muito parecida com a Susaninha! Agora vai lá buscar o pão à tua rica avozinha e dá-lhe cumprimentos meus. Ah e dá muitos beijinhos meus à tua mãezinha - disse enquanto se afastava. Ela seguiu viagem sem mais demoras e foi buscar o pão. A avó estranhou a demora e disse-lho quando chegou. Ela explicou a situação e entregou os cumprimentos à avó, que lhe perguntou quem era a senhora. Ela não sabia, descreveu a senhora o melhor que conseguiu. A avó não a reconheceu pela descrição, mas não lhe pareceu preocupada. Afinal de contas viviam numa aldeia, toda a gente se conhecia. Ela ficou, portanto, com um equívoco consertado, o da sua identidade perante a senhora. Mas ficaria com um equívoco por consertar pelo resto da vida.Até hoje não sabe quem era a senhora da blusa rosa shock. 

Uma Obra de Arte

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 17.11.19

Desde muito nova que gostara de escrever. Mas desenhar nunca tinha sido o seu forte. Quando a professora de História lhes mandou fazer uma banda desenhada sobre a Conquista de Ceuta sentiu-se, imediatamente, apavorada. Embora gostasse da disciplina, a nota não era a melhor.  Precisava de uma boa nota no trabalho para poder subir a média. Pensou no trabalho durante todo o percurso de autocarro que separava a cidade onde estudava e a aldeia onde vivia. Pelo menos era sexta-feira e tinha o fim de semana todo para pensar numa forma de realizar um bom trabalho. Durante a viagem, ao passar junto às terras que pertenciam ao seu tio, teve uma espécie de vislumbre da solução para o seu dilema. O tio. Claro, como podia não ter pensado nisso antes. O tio era a pessoa indicada para a ajudar. Só não sabia se ele iria ter tempo, mas logo que chegasse à aldeia iria falar com ele. Assim fez. Na paragem do autocarro, em vez de seguir o caminho que a levava à sua residência, subiu a íngreme rua que levava à casa dos tios. Falou com o tio que aceitou contribuir para o trabalho, feliz por poder ajudar. A tia convidou-a para almoçar no próximo dia e assim ela e o tio poderiam fazer o trabalho. Na manhã seguinte, mal acordou, pediu à mãe se podia ir para casa dos tios fazer o trabalho. A mãe acedeu e ela foi. Os tios já estavam à espera dela. A tia tinha acendido o lume na lareira, o tio tinha, como sempre, a música ligada. Depressa se espalharam os materiais que haveriam de usar para o trabalho. Ela explicou ao tio o que pretendia. Ele disse-lhe que faria os desenhos, mas que tudo o resto seria ela a fazer. Ela anuiu. Não esperava outra coisa. E, assim, deram inicio ao trabalho. Das colunas saía a música dos Metallica, uma das bandas preferidas do tio. Da cozinha chegava o cheiro da comida que a tia preparava para o almoço. O calor e o crepitar da lareira deixavam na sala um ambiente acolhedor. Por vezes perdia-se a olhar para as mãos do tio. Aqueles desenhos perfeitos, o toque suave e a facilidade com que ele fazia aparecer as ilustrações deixavam-na estupefacta. Nunca seria capaz de desenhar assim. O tio presenteva-a com uma ligeira cotovelada sempre que ela se distraía. Sabia que ela estava a admirá-lo, mas não queria que ela perdesse o foco naquilo que estava a fazer. Horas mais tarde, já depois de terem degustado o almoço preparado pela tia, finalizaram a banda desenhada. Depois de ambos terem feito a parte que lhes competia, afastaram-se do trabalho, e chamaram a tia. Ficaram os três a olhar para a tarefa que tinham concluído. Em algumas horas de dedicação tinham completado uma obra de arte. Viria a ser o melhor trabalho da turma. - Tio, tu és o melhor, tive a nota mais alta. A professora adorou. Disse-lhe ela quando recebeu a nota. - O mérito foi todo teu. Eu só fiz os desenhos, e que eu saiba a avaliação não era ao desenho. Respondeu ele. Ela pensou um pouco sobre o assunto. Era verdade. Mesmo assim respondeu ao tio: - Fazemos uma excelente equipa tio. Ele sorriu e anuiu. Sim, faziam.

Um Adormecer Tranquilo

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 16.11.19

Chega a casa cansada. Mais um dia exaustivo no trabalho. Demasiado trânsito, fila no supermercado infinita. Descalça os sapatos mal entra em casa, tira a roupa com emergência, como se com o simples facto de tirar a roupa pudesse também despir-se do stress do dia. Corre para o duche. Deixa que a água morna lhe passe pelo corpo demoradamente. Sai do duche, veste uma roupa confortável e dirige-se à cozinha a fim de acomodar as compras e preparar o jantar. Liga a música que começa, imediatamente, a ressoar nas colunas. Aumenta o volume. Nada como a música para a acalmar. Inicia então a preparação do jantar. Ele chega. Jantam. Demoram-se a conversar sobre o dia de cada um. Após o jantar, deleitam-se com o sabor do café enquanto ele fuma um cigarro. O dia foi longo para ambos. Ela acaba de arrumar a cozinha. Sem que nenhum diga uma única palavra seguem para o quarto, como que por mútuo acordo. Ela lê umas páginas do livro que tem na mesa de cabeceira enquanto ele vê uns vídeos no Youtube. Pernas entrelaçadas. Sempre a manter os corpos unidos, subtilmente. Ele aproxima-se dela. Ela pega no telemóvel com o intuito de ver as horas. Coloca o livro, novamente, sobre a mesa de cabeceira. Une o corpo, ainda mais, ao dele. Ele estica imediatamente um braço, com a intenção de que ela deite a cabeça. Ela aninha-se a ele. Cabeça na curva do ombro. Aquela curva onde ela encaixa tão bem. Sente o cheiro dele. E, mais uma vez, agradece por o ter com ela. Beija-lhe o peito. Ele, sem tirar os olhos do telemóvel, beija-lhe o alto da cabeça. Ela deixa-se ficar ali. Naquele porto seguro que é ele. O corpo dele. As vozes no vídeo começam a provocar-lhe sono. Os olhos começam a pesar-lhe. Enrosca-se mais nele. E ele percebe que ela vai adormecer. Abandona o que está a fazer. Coloca o telemóvel sobre a mesa de cabeceira. Agarra-a, de modo a ficarem de frente um para o outro. Beija-lhe a ponta do nariz. Começam a falar. De tudo. De nada. Fazem planos. Falam de coisas sem interesse. Falam do futuro e do próximo dia. Ele começa a falar de carros. Uma paixão que ambos têm em comum. Podem levar horas a debater o assunto. Qual o melhor turbo, o melhor motor, que embraiagem devem comprar, quais os melhores kits desportivos para cada carro, enfim. Conversas longas para quando estão com alento e vivacidade para as ter. Mas ela está cansada. Ele vê que os olhos lhe pesam. Beija-a ternamente e coloca-lhe o braço por cima. Não é a posição mais confortável para adormecer. Mas ele sabe que ela adora estar assim. Deixa-a adormecer. Vê-lhe a respiração mudar lentamente à medida que ela adormece. Acaba também ele por adormecer, embalado pela respiração dela. Há-de acordar a meio da noite com o braço dormente. Mas não se incomoda. Sabe que só ali, junto dela, pode desfrutar de um adormecer tranquilo

Uma Caminhada Curiosa

Desafio 30 dias de escrita

V de Viver, 15.11.19

Felicidade. Era a palavra que melhor lhe descrevia o estado de espírito sempre que se reuniam na casa dos avós. Aquele tinha sido só mais um almoço. Só ela, a mãe, a irmã, a tia, o tio e o primo, e os avós. Não lhe parecia que a felicidade pudesse ser mais do que aquilo. Almoçaram o feijão cozinhado ao lume pela avó. O avô fritara fatias de pão em azeite. Acabam de comer e enquanto a mãe e a tia, lavam a loiça e tratam de arrumar a cozinha, ela, a irmã e o primo seguem o avô e o tio. O avô e o tio vão até ao quintal. Aquele cheiro ao quintal dos avós era a coisa mais maravilhosa do mundo. Ouve a avó a falar com as filhas dentro da cozinha. Ela segue atrás da irmã e do primo. Sorri ao pensar como eles fazem uma dupla engraçada. Praticamente do mesmo tamanho, uma diferença de seis meses um do outro. Eram como irmãos. Mas isso não tinha nada que ver com a idade. Ela também considerava aquele primo, mais do que aos outros, como um irmão. Os pequenos seguiam no alcance do avô e do tio. Ela senta-se no chão de cimento do quintal. O dia está morno para aquela altura do ano. O sol espreita com intensidade e ela sente os raios a tocarem-lhe o rosto. Sabe que se a avó a vir ali vai gritar-lhe para que saia do sol antes que fique doente.  Sorri com o pensamento e desloca-se um pouco para ficar à sombra da grande ameixeira que sempre existiu no quintal dos avós. Não quer arreliar a avó. A mãe e a tia espreitam à porta do quintal. Falam sem cessar mas ela não as escuta. O avô abre o portão e diz: - Vamos, vá. Agora vamos todos dar um passeio ao campo. Os mais pequenos saltam de alegria e correm atrás do avô. Ela não salta, mas apenas porque já se considera uma mulherzinha, não há necessidade de se comportar como uma criança, pensa. Rejubila-se por dentro e saí também atrás do avô. Ao chegar ao ponto mais alto da travessa olha para trás. Vê a mãe e a tia, seguem lado a lado, falando baixo como se estivessem a partilhar segredos. A avó e o tio não os acompanham. A avó está demasiado debilatada para fazer caminhadas. Sempre a conhecera queixosa dos joelhos. O tio foi para casa ouvir música, tem a certeza disso. É o que ele faz sempre depois dos almoços de família, e muitas vezes ela acompanha-o. Na altura ela não sabia mas aquele tio viria a ser culpado por ela gostar tanto de música. Mas hoje quer seguir o avô. Sabe que com ele pode aprender o nome de muitas flores e árvores que irião encontrar no caminho. E, de qualquer modo, quando tem que escolher entre qualquer outra coisa e a companhia do avô a resposta é sempre óbvia. O avô. Seguem pelo caminho de alcatrão até entrarem num caminho de terra batida. O cheirinho a campo preenche o ar. Ouvem-se mosquitos a passar à volta da cabeça deles. Borboletas pairam, livres. Os pássaros cantam. Uma melodia enigmática, mágica, celestial. Ouvem-se as vacas a mujir ao longe. O relinchar dos cavalos. Todos os sons, simultaneamente, formam uma harmoniosa sinfonia. Ela, a irmã, o primo e o avô seguem em linha. Tão juntos que quase podiam tropeçar uns nos outros. Mas só assim conseguem ouvir tudo o que o avô diz. Esta não é a primeira vez que dão este tipo de passeio. Uma caminhada curiosa. Partilham risadas, cheiram os mesmos cheiros, vêm as mesmas paisagens. Campos verdes a perder de vista. Sobreiros. Azinheiras. O Alentejo é um sítio lindo. Seguem viagem por entre papoilas, mal-me-quer, e todo o tipo de flores silvestres. Ela olha para o avô. Nos olhos dele lê-se felicidade. Adora os netos. Adora o campo. Ela não consegue deixar de pensar que um dia o avô vai partir. Afasta as lágrimas que se lhe assomaram ao olhos. O avô parece sentir-lhe a inquietação pois chega-se a ela, passa-lhe o braço pelos ombros, deposita-lhe um beijo na cabeça e diz: - Minha menina! O medo extingue-se. A felicidade volta. Vê os pequenos a saltar mais à frente. O avô segue ao lado dela em silêncio. Olha por cima do ombro e vê a mãe e a tia na sua habitual conversa. Sorri. Dá-se conta do quanto valoriza aqueles momentos. Não passa de uma adolescente mas já sabe bem o que é o amor. Família. Família é o amor. 

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