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Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Qual é o nome da tua saudade?

V de Viver, 15.01.22

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É à noite que a saudade me dói mais. Quando pouso a cabeça na almofada vejo a vida passar-me diante dos olhos, como um filme em replay. Erros. Acertos. Lutas. Conquistas. Derrotas. Pessoas. A nossa vida não é igual sem pessoas. Por muito que alguém goste da solitude, ninguém gosta da solidão. Mas é à noite que ela mais se sente. Quando te deitas numa cama que nem sempre foi assim tão grande. Mas não foi o tamanho da cama que mudou, é o vazio que alguém lá deixou ao ir embora. Como aquele buraco vazio que se sente no peito, como se um espaço tivesse em branco quando até há pouco tempo estava recheado de cor. É à noite que fazes o balanço do dia. Que analisas o que fizeste, o que deixaste por fazer. O que disseste e o que deixaste por dizer. À noite quando aquela mensagem não chega. Aquela que esperavas todas as noites quando a presença não era opção. É muito fácil habituares-te a esse tipo de carinho. Difícil é adaptares-te à sua ausência. À noite, enquanto dás voltas e voltas constatando, mais que uma vez, que a cama não parecia tão grande há uns tempos atrás, pensas em como tudo na vida é passageiro. Em como tudo é incerto. Em como as pessoas vêm e vão com tanta facilidade. Cada um a viver as suas vidas. A tentar chegar à sua melhor versão. A querer ser melhor. A curar as suas feridas. E sabes, nesse momento enquanto as lágrimas se te assomam aos olhos, que não podes fazer nada quanto a isso. Que a nossa vida é como uma estação de comboio. Uma constante de chegadas e partidas. Que cada um tem, sim, que fazer o seu percurso. Que não podes, nem deves, prender ninguém. Que nem sempre os outros vão querer o mesmo que tu e que, mesmo quando dizem querer, podem de um momento para o outro mudar de ideias. Pouso a cabeça na almofada depois de mais uma volta na cama. Fecho os olhos. E imagino-me em outra cama, outro quarto, outra casa, outro país, porque não? Lá não estou sozinha. Lá a cama não é tão grande porque ao meu lado, a aquecer-me o corpo e alma está outra pessoa. Aquela pessoa. Todos temos uma pessoa que é aquela pessoa. E todos temos em nós o poder de fechar os olhos e imaginarmo-nos enroscados nos braços daquela pessoa. E aí respiramos fundo. Sorrimos. E, em paz, dormimos um sono mais tranquilo, mais doce e mais quente. Porque enquanto podermos sonhar, enquanto tivermos em nós o poder de imaginar a nossa vida de outra forma, conseguimos ter tudo. Por um segundo. Na nossa imaginação.

 

Fotografia:@google

É um dia mau, não uma vida má

V de Viver, 19.06.21

Hoje tive um dia difícil. Não foi cansativo, pelo contrário, foi até ocioso demais. Foi apenas mais um dia triste, daqueles que vez ou outra todos temos. Um dia em que acordei e pensei que tenho tanto e mesmo assim falta-me algo. Mas não falta sempre? O ser humano não é, na sua maioria, um bicho que nunca está satisfeito?! Enfim. No dia de hoje sentia a falta de uma coisa em específico. Bem, para ser totalmente honesta, de alguém específico. Sete meses se passaram desde o fim da minha relação e eu não posso dizer que já não sinto nada. É verdade. Há coisas que parece que nunca acabam, sentimentos que se nos cravam ao peito de tal forma que parece que fazem parte do nosso corpo. É difícil arrancar uma mão, não? Acreditem (provavelmente vocês até sabem) também não é fácil arrancar alguém do nosso peito. Ainda mais quando essa pessoa se manteve sempre por perto. Quando esteve ali num dos melhores momentos da minha vida (em vários na verdade) e quando foi a grande impulsionadora da realização do meu sonho. Quando terminámos ficámos amigos. Durante um tempo estivemos mais afastados, mas ainda assim falávamos muito. Nos últimos dois ou três meses tem sido quase diário. Mas somos apenas amigos. Queria conseguir deixar os sentimentos só na amizade, sabem? Acho até bonito casais que se mantêm amigos depois do fim da relação, julgo que mostra o carácter das pessoas. Mas é, confesso, difícil para mim ser só amiga. Ainda há sentimento além da amizade, e nem sempre é fácil lidar com ele. Hoje não foi fácil. Hoje não está a ser fácil. Não sei o que o futuro me reserva, ninguém sabe. Mas há dias em que só queria poder mandar. Exigir ao universo que voltemos a ser quem éramos (o que não deixa de ser curioso porque sempre disse que jamais voltaria para um ex, - se ele está no passado por algum motivo é - dizia eu). Amigos, amantes, irmãos, cúmplices, companheiros. Não perdi só um namorado há sete meses atrás. Perdi muito mais que isso. Ou poderei ser eu, ser apenas a minha cabeça, a querer insistir em algo que já não tem vida. Em algo que não existe mais, que talvez nem tenha existido da forma como eu imagino e sinto. Não sei. Simplesmente não sei. Hoje nada sei. Só sei que estou triste, e está tudo bem. Amanhã, com certeza, estarei melhor. É um dia mau, não uma vida má.

Distração

V de Viver, 18.06.21

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Já vos aconteceu fazerem algo apenas para não fazerem outra coisa?

Sim, é realmente um pergunta estranha. O que eu quero dizer é se já alguma vez se dedicaram a alguma actividade apenas para contrariar a vontade de fazer outra coisa, entendem?

Por vezes temos vontade de fazer algo, o nosso coração quer que o façamos, mas a nossa mente não quer.  Neste caso refiro-me a procurar alguém. Embora isto me pareça um pouco fútil ou até coisa de adolescente, a verdade é que hoje estou nesse "mood". 

Devíamos seguir o caminho mais simples, certo? Apetece-te ver aquela pessoa? Procura-a. Apetece-te falar com ela? Liga-lhe. É simples, eu sei. Mas como nós adultos (uma grande maioria de nós, pelo menos) temos tendência a complicar, nem sempre seguimos esses instintos. Eu até podia dizer que devemos segui-los sempre, mas todos sabemos que nem sempre é assim tão fácil. 

Então hoje, num momento vago, dei por mim a pensar em alguém. E a querer saber dessa pessoa. Mas como nem sempre aquilo que nos apetece é, propriamente, o melhor para nós, eu desviei a atenção para outra coisa. Na verdade ainda agora aqui, a escrever isto, estou a tentar ocupar o tempo e desviar a atenção da minha vontade. 

Isto para dizer que estou a colorir um livro (vejam só!) a fim de tentar ocupar a cabeça com outras coisas. Acho que não pegava em canetas de pintar há uns bons dez anos!

Já vos aconteceu?

Ah e importa dizer que estou a ouvir Eros Ramazzotti enquanto pinto. 

Na verdade foi uma boa escolha esta de pintar e ouvir música. Mas a grande verdade é que o "problema" não desaparece apenas por o colocarmos de lado. Podemos distrair-nos durante uns momentos, mas ele permanece lá. 

Só mais um dia...

V de Viver, 06.12.20

Hoje é só mais um dia. 

Mais um dia em que me dou conta do quanto a vida é efémera. Curta e passageira. 

Mais um dia em que percebo que devia aproveitar mais. Em que vejo que, se hoje fosse o meu último dia, não teria vivido tudo o que quero viver. Embora acredite que, chegue o final quando chegar, vamos sempre achar que podíamos viver mais.

Mas hoje é só mais um dia em que me aperta no peito a saudade dos que partiram para nunca mais voltar. Mais um dia em que sinto saudades dos que estão longe. Em que percebo o quanto nos afastamos das pessoas por coisas pequeninas e sem importância.

Hoje é mais um dia em que as lágrimas me escorrem pelo rosto por tudo o que podia ter sido e não foi. Por tudo o que podia ter vivido e não vivi. Por todos os erros, todas as quedas. 

Mais um dia em que chove lá fora e cá dentro. Em que o frio que se faz sentir lá fora não ultrapassa o gelo que carrego no peito.

Hoje é só mais um dia em que estou triste. Mais um dia em que não sei onde estou nem o que faço aqui. Mais um dia de nostalgia, de músicas tristes, de lágrimas e manta no sofá.

Mais um dia em que vejo a vida a fugir, a correr como se tivesse pressa de passar. Mais um dia em que alguém chora, como eu choro, as suas dores. Porque sei, nunca esqueço, que não sou apenas eu que tenho dias maus. Que não sou a única a ter dores para curar. E sei que há dores que são quase insuportáveis. Aprendi com a minha avó que não se pode morrer de dor, caso isso fosse possível ela teria morrido quando o filho morreu. Sei isso, soube sempre. Mas há dias em que a vida faz questão de nos lembrar. 

Há dias, como hoje, em que estamos triste não apenas por nós. Mas pela dor dos outros. E, embora não possamos carregar a dor dos outros, podemos com certeza sentir empatia. 

Hoje é só mais um dia em que choro. Em que tenho medo de não aproveitar a vida tanto quanto ela merece. Porque ela passa. Rápido. Rápido demais para alguns. 

Saudade repentina

Porque a saudade não avisa antes de se pavonear

V de Viver, 03.03.20

É surpreendente como a saudade não escolhe hora nem lugar para despontar e me dilacerar o coração. Pode ser um som, um cheiro, uma luz, uma palavra. Pode ser qualquer coisa e pode surgir do nada. E vinda de lado nenhum, qual relâmpago, trespassa-me o corpo. Primeiro deixa aquela sensação amarga. A sensação de que não devia ter sido assim. Que a vida podia ter sido de outra forma para ele, para eles, e para mim. De que tudo podia, e devia, ter sido diferente. A realidade de que foi demasiado sofrimento aparece, não pela primeira vez, e faz brotar grossas lágrimas dos meus olhos. Fico com o olhar desfocado e, quando o sinal verde liga, recordo que ali, no meio do trânsito, não é muito boa ideia deixar de ver. Não é boa ideia deixar-me levar pelas emoções. Pelas recordações. Pelas saudades. Mas é inevitável. E as lágrimas teimam em correr. Vem de seguida, puxada a ferros, a positividade. Podia ter sido pior, penso. Ele viveu muitos anos e, embora tenha sofrido muito com a morte do filho, viveu uma vida cheia de amor por parte da esposa, das filhas e, sobretudo, dos netos. Meu avô. Meu pai. Meu tudo. As lágrimas voltam a correr agora, voltam a desfocar-me o olhar enquanto escrevo. Inundam-me a alma tal como as saudades. Dói tanto não o ter cá. As vitórias não tiveram, nem nunca irão ter, o mesmo sabor sem os seus aplausos. A vida não tem a mesma cor desde que você partiu. O Alentejo não tem o mesmo calor, o mesmo sabor. Se pudesse voltar atrás no tempo, avô, dava-lhe todo o amor que lhe dei e mais ainda. Porque todo o amor do mundo não é suficiente quando ama-mos muito uma pessoa. As saudades apertam. A dor não passa, apenas adormece até que algo, sem que nada o faça prever, me faz recordar. Mas a vida continua, tem que continuar, até porque como dizia Charles Chaplin: " a única coisa tão inevitável quanto a morte é a vida".

Há dias e dias...

E dias que não são dias

V de Viver, 22.01.20

Há sete anos atrás o dia 22 de Janeiro foi o pior dia da minha vida. Se no dia anterior tinha recebido a notícia que viria abalar a minha vida completamente, nesse dia foi a descoberta de que existe realmente uma coisa que é para sempre: a morte.

O dia do funeral do meu avô foi o mais difícil da minha vida até hoje. Foi a primeira vez que fui a um funeral. Foi a última vez que vi o meu avô.

Sei que, por vezes, as pessoas desvalorizam quando falo da morte do meu avô, afinal de contas "ele era velhinho" como elas dizem. Como se o facto de ser velhinho mudasse alguma coisa no coração de quem os perde. Nunca vou perceber o porquê de as pessoas competirem a dor. "Eu sofri mais que isso, imagina quando morreu o meu pai, ele era muito mais novo" foi uma frase que me disseram ainda há dias. Achei "engraçado", a pessoa ter concluído que sofreu mais do que eu. Não sei como ela mediu isso mas, honestamente, também não quero saber. A vida não é uma competição de problemas e dores. Cada um tem as suas lutas, os seus pesos para carregar. Mas acho sempre curioso o facto de as pessoas usarem a expressão "já era velhinho" para desvalorizar a dor dos outros. Sim, era velhinho. Em número. Mas o meu avô era a pessoa mais forte que eu conheci. Nunca, mas mesmo nunca, o vi doente. Lembro-me perfeitamente de em criança pensar que ele ia viver para sempre. Nada o detinha. Mas não foi assim. Ele partiu.

Eu aceito, claro que aceito. Aceitar é inevitável nestas situações. É a lei da vida. Tudo é cíclico. Uns nascem outros morrem. Mas aceitar não significa concordar. O que também não significa que eu viva o resto da vida a pensar que foi injusto. Não. Foi como tinha que ser. Mas doeu. Caramba se doeu. Só eu sei como me doí ainda pensar naquele dia. Chorei tanto que cheguei a um ponto de me sentir fraca e desidratada. Com certeza pode ser exagero. Não devo ter vertido pelos olhos toda a água que tinha no corpo. Mas chorei muito. E choveu muito. Nesse dia eu disse à minha irmã: "mana parece que até os anjos estão tristes". Chorámos muito as duas. O céu também chorou, juro-vos que até hoje é isso que penso. Não me lembro de um dia tão escuro, tão chuvoso e tão triste na minha vida. 

Hoje está um dia escuro. Mas não chove. Contudo é inevitável que me lembre desse dia há sete anos atrás. Um dia que não foi um dia. Um dia que pareceu um ano. Que pareceu que nunca mais chegava ao fim. O dia que vi o meu avô pela última vez quando lhe depositei uma rosa branca sobre o caixão, no preciso momento em que o recolhiam ao túmulo. 

Há despedidas que doem demasiado. Aquelas que são para sempre são as piores.

Há dias e dias. E dias que não são dias. Esse dia não foi dia. 

Éramos felizes e não sabíamos!

V de Viver, 18.10.19

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Hoje era o aniversário da minha avó. A minha única avó. A única que me quis e que me aceitou.

Após a morte da minha avó caí na dura realidade de que não há mais avós. O avô foi-se, a avó foi-se! Aí avós se vocês soubessem como foram o nosso pilar, a nossa raiz. Se soubessem como tivemos uma infância feliz graças a vocês. Obrigada por nos terem permitido crescer da forma que crescemos. A esfolar os joelhos no quintal, a sujar as mãos com carvão para desenharmos o jogo da macaca no cimento do quintal, por sujarmos as mãos na horta, por regarmos a horta e ajudarmos a carregar a lenha miudinha. Por termos tido a possibilidade de andar de bicicleta na travessa, de apanhar caracóis, de aprendermos a caiar. Como éramos felizes por termos carretas e fazermos corridas no quintal. Por termos crescido a espalhar os brinquedos pelo quintal e na casa do lume. Por termos cozinhado a fingir com talos da couve e cascas das batatas. Por temos aprendido lenga-lengas, anedotas e advinhas. Por nos terem ensinado a jogar às cartas, o que é um naipe, um rei, um duque. Pelas tardes a ver televisão deitados no chão, só uma manta por baixo, a comer batatas fritas na hora do calor porque só depois podíamos ir fazer asneiras para o quintal. Por termos percebido o que significa comer em união numa mesa redonda com braseira, e como dizia o avô quando começávamos a falar e a fazer demasiadas perguntas: “Ovelha que berra bocado que perde”. Obrigado avô por todas as vezes que nos foi levar e buscar à escola, muitas vezes debaixo de chuva só protegido pelo fraco guarda-chuva. Obrigada pela educação, pelas reprimendas, pelos incentivos. Obrigada até pelas palmadas avó, e obrigado por nunca nos ter dado uma palmada avô. Obrigada por nos deixarem crescer livres, por nos terem aturado as birras, por terem conseguido aguentar quando nos juntávamos quatro ou cinco lá em casa e a avó dizia “Um sozinho é um santinho, juntos são uns diabinhos”. Obrigado avô por nos ensinar que nem sempre o que está partido tem que se deitar fora, que as coisas podem ser reutilizadas, pois foi isso que nos mostrou desde muito cedo, que com algumas coisas velhas se faz um brinquedo. Uma mesa para as barbies, um roupeiro, um sofá. Obrigada por nos ter feito tantos brinquedos e já agora saiba que ainda os guardamos todos. Obrigada por nos deixar brincar no alpendre. Obrigada por nos deixarem “tomar banho” dentro do tanque da roupa, e por todos os banhos de mangueira no quintal, e pela água que nos deram a beber tantas vezes directamente do poço. Obrigada pelo feijão feito ao lume e pelas migas, nunca mais ninguém irá conseguir igualar o sabor da comida dos avós.

Obrigada por tudo, por terem feito parte da nossa vida, por terem sido sempre tão presentes, e por nos terem feito tão felizes. Foi, sem dúvida, devido à vossa presença que fomos crianças tão felizes. Guardo todos esses momentos com a certeza de que não poderia ter sido mais feliz do que fui na minha infância, e de que foi, sem dúvida alguma, a melhor fase da minha vida. 

Os dias felizes na casa (e principalmente no quintal) dos avós acabaram. Mas vocês viverão para sempre dentro de nós.  

Éramos felizes e não sabíamos!