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Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

Coisas que eu [não te] disse

Tudo o que não consigo dizer, escrevo.

É o amor que faz girar o mundo

V de Viver, 13.02.23

Não gosto muito de dias sem sol. Deixam-me nostálgica. Fico pensativa, introspectiva e com menos energia. Fico, quase literalmente, da cor do dia. Cinzenta. Estava ainda agora a ler um romance, mas fazia-o sem grande entusiasmo, honestamente. "O Livros dos Dois Caminhos", da grande escritora Jodi Picoult, lá porque estou com pouco entusiasmo não faz do livro menos bom.

Curiosamente há uns anos só lia romances. Hoje levo tempo para ler um e já não o faço com o mesmo encantamento. Ainda acredito no amor. Sim, continuo a acreditar que é possível amar e ser amado. Continuo a dar amor a quem se cruza no meu caminho. Mesmo aos que, claramente, não chegam com essa intenção. Mas isso é só mais uma prova de que não controlamos nada, só podemos controlar a forma como reagimos às diversas situações da vida. 

Às vezes tenho a mente tão assoberbada de ideias que me custa escrever. Como hoje, como agora. Nestes dias a minha escrita torna-se confusa. Começo a escrever por um motivo mas as ideias surgem umas atrás das outras, a empurrarem-se para abrir caminho para ver qual chega primeiro ao papel. Geralmente nestes dias não sei o que sinto. Por vezes não sei o que quero. Nestes dias costumo dar-me espaço apenas para existir. Não me exigir muito. Afinal de contas se até a natureza tem dias cinzentos, de sombra, porque não haveria eu de poder tê-los? Tenho calor, curiosamente. Estão 13º lá fora e há pouco estava gelada. Às vezes sinto-me gelada. E sozinha. Quase como se uma coisa levasse à outra. Mas na maioria dos dias gosto e prezo a minha solidão. Solitude. Não sei bem. Mas aprendi, realmente, a apreciar a minha própria companhia. Na maioria dos dias. 

No fundo sou grata a estes dias cinza. Estes dias que me fazem lembrar que nem todos os dias precisamos de estar a 100%. Que o nosso melhor pode ser diferente todos os dias da nossa vida.

Gosto de sentir que aprendo todos os dias alguma coisa. A sabedoria e o conhecimento sempre me cativaram. E quanto mais velha fico mais vontade sinto de aprender. Não necessariamente sobre outros ou sobre algo em especifico. Mas sobre mim. Adoro esta sensação de que me conheço perfeitamente. Esta sensação de que sou a única pessoa no mundo capaz de me perceber, de me amar, de me dar aquilo que quero, que preciso e que procuro. 

Esta percepção de solidão que me trás a sensação de que não preciso de ninguém. De que me basto. De que me tenho a mim mesma e que isso já significa ter o mundo. Ser o mundo. O meu mundo. 

O sol aparece por entre as núvens de vez em quando. Esforça-se por aparecer, por se manter visivel. Por vezes todos nós somos sol. Esforçando-nos para acordar, para sair da cama, para fazer o que tem que ser feito. Mas é bom ser como o sol. Saber que mesmo quando não brilhamos ainda estamos aqui. Dentro de nós mesmos há uma luz que nunca se apaga. Até ao dia em que se apagará para sempre. Mas, não sei porquê, acho que mesmo nesse dia a nossa luz se manterá a brilhar. Enquanto formos lembrados pelos que nos amam, por aqueles cujas vidas conseguimos tocar de uma forma ou de outra. O que me recorda que é o amor. É sempre o amor a chave de tudo nesta vida. É e será sempre o amor que manterá as pessoas vivas. Que manterá o mundo a girar. Sim, é o amor que faz girar o mundo. O amor que sentimos pelos outros. Mas também o amor que sentimos por nós mesmos. E seja qual for o tipo de amor, o importante é que nunca o deixemos morrer. Porque enquanto existir amor as engrenagens da vida continuam a girar, o tempo continua a correr e nós continuaremos vivos. Aqui, ou onde quer que estejamos. Será sempre o amor.

Que nunca nos esqueçamos disso. 

O meu primeiro pôr do sol do ano

V de Viver, 13.01.22

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Escrevo estas palavras sentada numa velha prancha de surf, na minha praia, num cantinho que deve ser de muitos mas que agora é só meu. Vim ver o mar e o pôr do sol, mas o sol ainda está alto mostrando que ainda demorará uns minutos para ir embora. Embora para onde nunca saberei. Ouço as ondas enquanto ouço também uma música no meu único fone de ouvido, o outro há muito que partiu nas ondas deste mar que me faz companhia em melodia de fundo. Penso na vida. Em tudo o que já vivi, em todas as lutas e em como umas desencadearam em vitórias e outras em aprendizagens. Penso nas pessoas que passaram na minha vida e naquilo que aprendi com elas. Penso nos meus avós e em como tenho saudades deles. Penso na minha mãe, na minha irmã. Penso nos amores e nos que não chegaram a sê-lo. A vida é curta, é imprevisível. As pessoas, tal como as ondas do mar, vem e vão. Tenho uma vida recheada de partidas. Mas para terem partido essas pessoas têm que ter chegado. Por isso ouso dizer que tenho, também, uma vida cheia de chegadas. Penso onde estive, onde já cheguei e onde ainda vou chegar. É este o poder do mar e do sol sobre mim. Fazem-me pensar no meu passado, reflectir sobre ele, mas fazem-me também ter esperança no futuro. Tudo é incerto. O que hoje é amanhã pode já não ser. Inclusive eu. Hoje estou viva, mas amanhã? Amanhã não sei. Provavelmente é este o encanto da vida. Não sabermos nada. Nem de onde viemos, nem para onde vamos. O sol aquece-me o rosto fazendo a temperatura contrastar com o gelo em que estão os meus pés. O sol continua alto. Mas vou ficar na praia para o ver partir. Para me despedir de mais um dia, agradecendo por ter tido direito a ele. E enquanto olho o sol agarro-me à esperança de ainda poder apreciar muitas das suas partidas. 

Desabafos de Dezembro

V de Viver, 13.12.21

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Sentada numa arriba, como se pairasse sobre a imensidão do mar, ouço o barulho das ondas a rebentar na areia acompanhadas pelos gritos incessantes das gaivotas.Também eu grito em silêncio. Foi exactamente para gritar que sai de casa e vim até aqui. 

Já sentia falta deste sitio. O sol de Dezembro aquece-me o rosto contrariando a brisa fresca que vem do mar. À minha volta só a natureza. Ao longe algumas pessoas mas aqui apenas eu. Sozinha. Como sempre me senti. Mas já há muito que não temo a solidão. Aprendi a fazer-me companhia a mim mesma, e gostei. E é isso que por vezes me assusta. Gostar tanto da solidão. Gostar tanto de estar sozinha. Tenho medo de deixar de sentir. Temo não conseguir mais aproximar-me de ninguém. Sinto amor, não me interpretem mal. Sinto amor pelos meus, pela minha família, por mim. Mas amo tanto estar sozinha. Escrevo agora coisas sem sentido, eu sei. Estou num desses dias em que as ideias, os pensamentos, são mais rápidos que os meus dedos. Num desses dias em que não consigo acompanhar o meu raciocínio. 

As ondas vêm e vão. Rebentam formando a espuma que rapidamente desaparece na areia. Verde, azul, creme. As cores que me rodeiam. Mar. Gosto tanto que por vezes me sinto como se fosse apenas uma extensão dele. É inexplicável. Por vezes penso como seria entrar nele e perder-me. Mas não sei se somos nós que entramos nele ou se é ele que entra em nós de toda a vez que nos toca. Consigo senti-lo na pele embora esteja uns bons metros acima dele. 

Tenho-me sentido perdida. Não sei bem o que sinto. Não estou triste, não mesmo. É mais como se um barulho de fundo não saísse da minha mente. Como se alguma coisa quisesse sair de dentro de mim. 

Mas estou em paz. 

Não é isso que todos procuramos? Sinto uma enorme gratidão por este último ano, mas sobre isso escreverei depois. Agora quero apenas deixar fluir os pensamentos e deixar a caneta rolar nas folhas do meu pequeno caderno. Gotas de lágrimas tingem o papel à medida que a caneta avança. Rabiscos de dor. Rabiscos de vida. A vida é algo tão difícil de descrever. 

Estou em paz.

Sinto o coração tão livre como uma borboleta. Borboleta. Sempre gostei de borboletas. Apercebo-me hoje que sempre quis aquilo que elas simbolizam. Transformação. E consegui. Já não sou aquela menina assustada, aquela adolescente incompreendida. Sou hoje a mulher que sempre quis ser. Quero sempre melhorar, quero sempre mais. Sempre fui uma insaciável. Sempre tive fome de viver. Sempre. Mas aprendi, com o grande professor que é o tempo, a viver com calma. A esperar sempre mais mas com a consciência que nem tudo chega quando quero. Por vezes há coisas que só chegam quando ela, a vida, sabe que estamos preparados. 

Portimão, 03/12/2021

Queda decadente

V de Viver, 15.12.20

Estou a cair. Uma queda lenta e dolorosa. Vejo, como que em câmara lenta, o filme da minha vida a passar-me diante dos olhos. As lágrimas escorrem pelo meu rosto deixando os olhos turvos. Tento parar a queda. Tento evitar a escuridão que me espera lá em baixo, cada vez mais escuro, e mais e mais. Esforço-me para pensar em coisas felizes: penso na minha família, vejo o rosto da minha mãe e há uma luz que parece querer trespassar a escuridão. Mas logo vai embora. Tudo escuro, continua tudo escuro e continuo a cair. Não tenho onde me agarrar. Não quero mais continuar a descer mas não sei como parar esta queda. Música. Começo a cantar. A música sempre me fez companhia. Canto, e canto e consigo até ouvir a melodia ao longe. Mas ainda estou a descer. Mar. Imagino as ondas do mar a bater na areia, a espuma a formar-se e a dissipar-se junto às conchas. Escuridão, continuo rodeada de escuridão. Nem o sol, nem a música, nem o mar, nem sequer a família. Parece que nada me sustem, que nada me ampara a queda. Continuo a descer. Sei que há uma linha ténue entre mim e o abismo. Mas não sei como evitar cortá-la, como evitar passar para o lado de lá. Foi tudo. Foi o ano de merda que está quase no fim, foram todos os outros anos da minha vida em que andei a fingir que estava tudo bem. Foram todas as quedas que dei, todos os erros que cometi. Tudo isso me fez entrar nesta queda que parece não ter fim. Sempre fui grata, ou sempre gostei de pensar que era, não sei, não faz diferença agora. Porque tudo o que sinto é ingratidão. Pareço ter tudo e sinto-me como se não tivesse nada. Tenho trabalho, tenho familia, tenho um teto. Porquê? Porque me sinto como se não tivesse nada? Talvez aquilo que me falta não seja ter. Mas ser. Sei, no fundo do meu coração a resposta pulsa: é ser que te falta! Mas como posso ser se tudo o que quero é estar sozinha na escuridão. É chorar. É estar em paz, na minha paz vazia. Mas não é esta escuridão que eu quero, não esta em que me sinto numa montanha russa onde apenas existe descida. Não! Quero tanto sair daqui. Alguém me ouve? Alguém me vê? Ninguém. Sozinha. Estou sozinha como sempre estive. Mesmo rodeada de pessoas, sempre estive sozinha. Uso o riso para disfarçar a dor. Digo piadas, consigo rir de mim mesma, brinco e falo alto. A minha gargalhada estridente esconde tanta dor, ai se vocês soubessem. Tanto que quero calar as minhas dores e o tanto que uso o riso para isso. Mas não, já não está a funcionar. Já não é suficiente. Não quero mais fingir. Quero chorar. Quero gritar. Quero sair deste poço onde me encontro a cair esta queda decadente. Quero sorrir de verdade. Quero fechar este buraco que se me abriu no peito. Quero parar de entupir o buraco com comida. Alguém me ouve? Alguém me vê? Só quero parar de comer para suprimir o vazio. Não quero mais tentar fechar este vácuo com comida. Não quero mais estar triste. Como é possível eu saber que estou triste e não querer estar triste e ainda assim continuar triste? Como pode doer tanto algo que nem sei o que é? Feridas invisíveis são difíceis de curar. E quase impossíveis de explicar. É uma dor, sabem? Uma dor no peito, eu diria no coração, mas parece algo demasiado romântico, e a minha vida nada tem de romântica. É como um peso. Sim, como se um haltere de cinquenta quilos estivesse sobre o meu peito. E eu quero retira-lo. Mas os meus braços não têm força suficiente. Eu luto, puxo, empurro, mas ele não sai. Parece estar pregado ao meu peito com um milhão de pregos. Não tenho como retira-lo daqui. Sinto que preciso despir uma pele. Sim, é isso. Sinto que se despir esta pele talvez seja feliz. Talvez esteja em paz. Talvez este vazio deixe de doer. Mas como raio pode doer o vazio? Não quero sair. Trabalhar é um castigo, mas só às vezes, outras vezes é tudo o que tenho. Não quero correr, deixei de treinar e sinto-me mal por isso. Cá está ele, o efeito bola de neve: não me sinto bem, não treino, não treino e por isso não me sinto bem, e por isso não treino. E a bola vai rebolando, e rebolando. E a vida vai passando e passando. E não sei quando será o meu último dia. E sempre que penso nisto penso na minha mãe. Não quero, nunca, que ela sinta a dor de perder uma filha. Não posso morrer. Mas é isso que estou a fazer. A morrer enquanto ainda cá estou, enquanto ando pela rua, enquanto respiro, enquanto trabalho. A morrer lentamente, de olhos abertos a ver a vida passar. A deixar  apagar o meu brilho. A chorar a toda a hora. E porquê? Não sei, oxalá soubesse. Alguém me ouve? Alguém me vê? Não quero mais esta dor. Digam-me em que caixote do lixo posso coloca-la. Digam-me como posso despir esta pele sem brilho, como posso voltar a ser eu? Alguém me diz onde fiquei? Alguém sabe onde estou? Se me encontrarem tragam-me de volta, tenho saudades minhas.